PEDRO MIWA

Uma convivência possível?

CÃES X JARDIM

    Há mais de 10.000 anos começava uma história de cooperação e amizade que mudaria drasticamente os estilos de vida de dois seres únicos no mundo: – O homem e o cão.

     Vindo diretamente de uma linhagem de caçadores astutos e cooperativos, o cão doméstico que conhecemos, surgiu no tempo das cavernas quando lobos mais dóceis se aproximaram do homem e resolveram mudar de hábitos e não mais viver livres e a mercê dos elementos, mas ajudando seus novos amigos humanos a caçar em troca de alimentação e abrigo. Desde então, homem e cão construíram uma improvável aliança interespécies que perdura até hoje. Atualmente o cão exerce as mais diversas funções, desde a caça e o apanhe da presa, passando pelo pastoreio, guarda patrimonial, guia de cegos, rastreamento e operações de resgate, e finalmente a tarefa mais comum a de fazer companhia para os humanos.

     No transcorrer de gerações e com práticas de cruzamentos seletivos foram alteradas várias características físicas e comportamentais dos cães, hoje ele – o cão – existe nos mais diversos padrões de tamanho, forma, cor e pelagem e mais de 400 raças são reconhecidas.  

    Observando as casas e as famílias, fica claro que nos dias de hoje, cada vez mais lares possuem um ou vários cães, definitivamente eles fazem parte da vida cotidiana. O cão é naturalmente curioso e ativo tendo uma atitude investigativa quanto ao ambiente em que vive, vasculhando e verificando todos locais da casa, inclusive o jardim.

     É importante saber que cada tipo de cão tem um rol de comportamentos que são característicos de cada grupo de raças, assim os “Cães da Terra – terriers” são exímios escavadores e caçadores de roedores, os “Cães de Guarda” são ativos, fortes e protetores, os “Cães de trabalho” como o Labrador são muito ativos e os “Cães de companhia” são leias e tranquilos. A relação dos cães com o ambiente do jardim está diretamente ligado a dois fatores primordiais: – a índole natural da raça e a educação que o animal recebe. O sexo do animal também influencia, uma vez que os cachorros tendem a ser mais dominadores e territoriais e as cadelas mais dóceis e submissas, contudo isso não é regra, há exceções. Às vezes o excesso de proteção e mimos que o cão recebe do ser humano causam distúrbios comportamentais que podem gerar frustração e raiva que os cães descarregam no ambiente em que vivem mordendo e destruindo objetos e plantas. Nestes casos só um processo de adestramento reverterá esta situação de stress adquirido.

     Com base nestas informações o planejamento do paisagismo pode minimizar os danos que o cão possa infringir ao jardim, criando um ambiente onde todos (cães e humanos) podem conviver tranquilos e usufruir o jardim.

     Os cães da terra – Terriers – são em sua maioria pequenos ou médios, exemplos são o Fox Paulistinha, o Airdale e o Bull Terrier, este grupo de cães é caçador de ratos e pequenos animais, gostam muito de escavar o terreno e não vem problema algum em passar por entre plantas para alcançar seu objetivo, são hiper ativos e por esta razão devem dispor de muito espaço livre. O tipo de jardim recomendado para estes cães constitui-se de um amplo gramado com alguns arbustos e arvoretas médios e altos dispostos junto aos muros e um pátio com piso cimentado áspero ou de pedra onde podem ser mantidos vasos de altura mediana com plantas e flores mais delicadas, uma caixa de areia é um verdadeiro deleite para estes pequenos escavadores.

      Os cães de guarda e os cães de trabalho são médios ou grandes, tem grande agilidade e força física e são muito ligados ao território e à defesa do espaço, exemplos são o Pastor Alemão, o Fila Brasileiro, o Labrador e o Dálmata. Em geral são cães que não possuem hábitos de escavação e destruição de plantas, contudo é importante observar alguns aspectos para que o jardim se harmonize ao “modus vivendi” destas raças. Os cães de guarda principalmente gostam de patrulhar os portões e os muros de seu território, por esta razão grama e terra exposta devem ser evitadas nestas áreas, assim como plantas baixas que seriam pisoteadas até a destruição total. Os cães de trabalho são mais submissos que os de guarda, porém também gostam de percorrer trilhas, razão pela qual os passeios e caminhos do jardim devem ser pensados de maneira que o cão tenha percursos bem delimitados, pois em geral eles ignoram curvas e sinuosidades, traçando sempre uma linha reta, mais objetiva. São cães que sentem muito calor sendo importante a presença de árvores ou plantas altas que forneçam sombra, gramados também servirão bem, pois são frescos ao contato. Quanto às plantas ornamentais, devem ser escolhidas aquelas que possuam estrutura robusta e folhas resistentes, pois o contato físico entre cães e planas sempre ocorrerá.

      Os cães de companhia, por sua índole tranquila e pacífica, são os que menos problemas têm para se relacionar com o jardim, exemplos são o Llasa apso, o Maltês, o Pug e Poodle. Em geral respeitam as plantas e os objetos de decoração, assim como aceitam pequenos animais como pássaros e tartarugas. Na maioria são cães de pequeno porte com pelagem farta e sedosa, por este motivo devem ser evitadas plantas com sementes pegajosas e que possuam folhas e caules espinhosos onde os cães possam se enroscar e ferir.

       Um assunto que é desagradável, mas deve ser citado, são os dejetos caninos. A urina dos cães é rica em amônia que em pequenas doses é um fertilizante natural para as plantas, contudo quando um cão urina várias vezes em um local poderá matar as plantas por queimadura química. A solução é educar o cão a urinar em um local de fácil limpeza, como uma área de piso frio perto de um ralo. Também podem ser instalados pequenos postes de madeira sinalizados com odor em caixas de areia para que ali os cães façam suas necessidades, trocando a areia periodicamente. As fezes são outro fator poluente ao jardim, uma vez que atraem insetos indesejáveis, sempre devem ser recolhidas. O contato direto das fezes com as plantas também pode causar queimaduras e matar plantas mais sensíveis. Quanto à ração do cão, não a deixe disponível por todo o dia, ela pode atrair ratos e pombos.

      Um cão é um amigo leal que traz movimento ao ambiente e alegria às pessoas por muitos anos, ao adotar um filhote pense na celebre frase: – “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas…”, do livro “O pequeno príncipe”, de Antoine Saint-Exupéry.